sábado, 17 de dezembro de 2016

O Sermão da Montanha



O famoso “Sermão da Montanha”, pode ser considerado o A-B-C do cristianismo, já que nele, somos discipulados nos requisitos primordiais para o ingresso definitivo no Reino dos Céus. É preciso compreender que Jesus, enquanto homem, foi um dedicado estudante da lei mosaica, e seu domínio do Talmude era reconhecido até mesmo pelos líderes da sinagoga de Nazaré, que se assentavam para ouvir seus ensinamentos (Lucas 4:16-30). Jesus dominava os preceitos da Torá e esmiuçava em detalhes os relatos dos profetas antigos desde a mais tenra idade (Lucas 2:41-52), e agora, com seu ministério público a todo vapor, Jesus ansiava por revelar aos seus discípulos uma nova visão sobre a lei, obscurecida por uma religiosidade corrompida. Cristo era um cumpridor da lei, e este é um fato inquestionável.

Jesus respeitou a cultura local, cumpriu rituais da religião judaica e pagou os impostos devidos a Roma. Porém, como parte de sua missão, veio para corrigir pontos falhos desta mesma lei, e dar uma dimensão espiritual para conceitos até então, apenas materiais (Mateus 5:48). A lei instruía, fiscalizava e punia ações praticadas, mas Jesus estava preocupava em conscientizar as pessoas sobre as “intenções do coração”, um conceito que mesmo esquecido pelos religiosos, estava estabelecido desde o Antigo Testamento (I Samuel 16:7). Embora Lucas cite alguns trechos deste grandioso discurso, Mateus parece transcrevê-lo na íntegra, tornando seu texto numa base obrigatória para qualquer discipulado cristão.

Mateus relata que uma grande multidão se agrupou em torno de Jesus, a fim de ouvi-lo.  Aquela audiência era formada por pessoas vindas de todas as partes da Judeiainclusive, da capital Jerusalém, além de muitos viajantes oriundos da costa marítima de Tiro e Sidom. Grande parte desta gente estava enferma, e almejava uma cura. Outros tantos eram atormentados de espírito e buscavam libertação, e todos tentavam desesperadamente “tocar” em Jesus, a fim de receber sua virtude. Então, para ter uma maior abrangência, Cristo se dirigiu a uma região montanhosa, escolhendo ali um lugar “plano”, criando assim um tipo de “anfiteatro improvisado” (Mateus 5:1 / Lucas 6:17). Os discípulos de Jesus se assentaram a sua volta, e Ele começou a ensiná-los.

Mais do que “dar o peixe”, Jesus ensinaria aquela multidão a “pescar”. Pela primeira, vez Jesus se dirige a um mundo legalista e imerso em religiosidade vazia, clamando em alto e bom som por uma mudança no comportamento social e religioso, que deveria passar primeiro pela reforma do próprio pensamento humano. Seus seguidores são ensinados a pensar com a mentalidade do Reino dos Céus, priorizando o “eternal” em lugar do “efêmero”, o “celestial” ao invés do “terreno”. E é aí, que reside a dificuldade em pôr em prática tais ensinamentos, pois seu fundamento básico é levar o indivíduo a deixar de ser “quem ele é”, e se tornar “quem Deus deseja que ele seja”. A renúncia pessoal é a maior característica dos integrantes do Reino dos Céus, e este é o princípio básico de todo ensinamento de Jesus, e quem deseja se engajar em sua “causa santa”, imediatamente se coloca na contramão do fluxo natural do mundo, nadando contra uma forte correnteza.

Ser cristão, é se opor a um sistema dominante, o que certamente, colocará um alvo em nossas costas, nos fazendo vítimas de ataques diários e incessantes, quando não, mortais. E segundo o próprio Cristo, isto deve ser para nós, motivo de alegria. Tem como ser mais paradoxal? Sim!

O termo “bem-aventurado”, que abre o sermão de Jesus, significa mais do que o estado emocional representado pela felicidade. Ele inclui um bem-estar espiritual, baseado na aprovação de Deus e na plena certeza que nossa felicidade está assegurada na eternidade, mesmo que a vida na terra nos reserve apenas sofrimento, abnegação e renúncia. Em seu sermão, Jesus nos ensina a sermos a luz num mundo de trevas e o sabor numa sociedade insípida. Em outras palavras, temos que ser diferenciais. Amar os inimigos, orar por quem nos persegue, abençoar quem nos amaldiçoa, oferecer a outra face a quem esbofeteia nosso rosto. Cristo nos ensina que não existem recompensas para quem barganha o amor (amar por ser amado), ou para quem usa a devoção como marketing pessoal, já que Deus nos vê em secreto (Mateus 5:46; 6:6). A lei punia o homicídio, mas agora Jesus equipara a calúnia ao assassinato. Se a religião condenava o adultério, Cristo vai muito mais a fundo ao censurar os pensamentos lascivos (Mateus 5:21-28).

A grande (e dolorosa) verdade é que, quando revistamos o “Sermão do Monte”, nossas ações e pensamentos são confrontados pela “legislação” do Reino dos Céus, e temos a compreensão de como ainda estamos distantes de cumpri-la com totalidade. Conhecemos "de cor e salteado" o texto de Mateus 7:13, e falamos com empolgação sobre a porta “estreita”, mas de fato, desconhecemos suas reais dimensões. Ser cristão é nascer de novo, da água e do espírito (João 3:1-4). O nascimento da água pode ser entendido como um processo de purificação, onde o homem, através de sua fé em Cristo, é limpo de todo seu pecado e lavado pelo Sangue de Cristo, símbolo máximo da Aliança Neo Testamentária (I Coríntios 11:25).

Já o nascer do Espírito remete a uma mudança completa na forma de pensar e agir, quando o velho homem é crucificado com Cristo, amortizando assim a vontade da carne e dando vazão ao espírito que desde o princípio clama por Deus. Esta transformação leva a um indivíduo a um novo estado de prioridades, onde elementos terrenos, antes causadores de tristezas e frustrações permanentes, são renegados a um status de inferioridade, sendo nossa mente ocupada por temas “eternais”. E se esperamos em Deus e no seu Reino, vivemos em graça e esperança, acalentados pelas promessas fieis de nosso Deus. Não existe felicidade maior.

Pb. Miquéias Daniel Gomes

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