Há séculos conta-se a história de um rico mercador grego que tinha
um escravo chamado Esopo, do qual se diz que era corcunda e feio, mas de uma
grande sabedoria.
Certa vez, para provar as qualidades de seu escravo, o mercador
ordenou:
– Toma, Esopo, pegue estas
moedas, vá ao mercado e compra lá o que houver de melhor para um banquete. Hoje
eu quero comer a melhor comida do mundo!
Pouco tempo depois, Esopo voltou do mercado e colocou sobre a mesa um
prato coberto por fino pano de linho. O mercador levantou o paninho e ficou
surpreso:
– Ah!! Língua? Eu adoro
língua. Nada como a boa língua que somente os gregos sabem tão bem
preparar. Mas por que escolheste exatamente a língua como a melhor comida do
mundo?
O escravo explicou sua escolha:
– O que há de melhor do que a
língua, senhor? A língua é que nos une a todos, quando falamos. Sem a língua
não poderíamos nos entender. A língua é a chave das ciências, o órgão da
verdade e da razão. Graças à língua é que se constroem as cidades, graças à
língua podemos dizer o nosso amor. A língua é o órgão do carinho, da ternura,
do amor, da compreensão. É a língua que torna eterno os versos dos grandes
poetas, as idéias dos grandes escritores, a filosofia dos nos filósofos. Com a
língua se ensina, se persuade, se instrui, se ora, se explica, se canta, se
descreve, se elogia, se demonstra, se afirma. Com a língua dizemos “mãe”,
“querida” e “Deus”. Com a língua dizemos “sim”. Com a língua dizemos “eu te
amo”! O que pode haver de melhor do que a língua, senhor?
O mercador levantou-se entusiasmado:
– Muito bem, Esopo! Realmente tu
me trouxeste o que há de melhor.
Uma semana depois, o patrão chamou Esopo, deu-lhes moedas
novamente e disse:
– Vai de novo ao mercado e traz
o que há de pior para se comer, mas, desta vez eu quero provar o que há de
pior para comer. Seja lá o que for, insetos, ervas amargas… qualquer coisa.
Esopo voltou do mercado trazendo um prato coberto por um pano. O mercador
recebeu-o com um sorriso:
– Hum… o que há de melhor eu já
sei, vejamos agora o que você achou de pior no nosso mercado.
O mercador descobriu o prato e ficou indignado:
– O quê?! Língua? Língua outra
vez? Não disseste que a língua era o que havia de melhor, Esopo? Que
brincadeira é essa?
Esopo, sabiamente, respondeu:
– A língua, senhor, é o que há
de pior no mundo. É a fonte de todas as intrigas, o início de todos os processos,
a mãe de todas as discussões. É a língua que separa a humanidade, que divide os
povos. É a língua que usam os maus políticos quando querem nos enganar com suas
falsas promessas. É a língua que usam os vigaristas quando querem trapacear. A
língua é o órgão da mentira, da discórdia, dos desentendimentos, das guerras,
da exploração. É a língua que mente, que esconde, que engana, que explora, que
blasfema, que insulta, que se acovarda, que mendiga, que xinga, que bajula, que
destrói, que calunia, que vende, que seduz, que corrompe. Com a língua dizemos
“morre”, “canalha” e “demônio”. Com a língua dizemos “não”. Com a língua
dizemos “eu te odeio”!
- Sim, senhor... Completou Esopo... -A língua é a
pior e a melhor de todas as coisas!
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