segunda-feira, 23 de maio de 2016

Por que Davi fracassou como pai?


Quando falamos das relações pais e filhos, talvez o texto bíblico mais incisivo, conhecido e comentado seja Provérbios 22:6: “Instrui o menino no caminho em que deve andar, e mesmo quando envelhecer, não se desviará dele".

Um erro comum na citação deste texto é trocar o indicativo “no” por “o”. O conselho aqui expresso não é para se indicar “o” caminho (vá por ali), mas sim ensinar “no” caminho (ande ao meu lado). O grande discipulador aqui não é o vocabulário, mas sim o próprio exemplo. Pais íntegros que almejam uma vida de integridade para seus filhos não se encaixam nos moldes mundanos do “faça o que eu digo e não o que eu faço”, mas criam ao longo do caminho, o rastro de pegadas onde seus pequenos discípulos também porão os pés.

Salomão, ao escrever o texto supracitado sabia muito bem do que estava falando, pois viveu esta realidade dentro de sua própria família. Davi foi o maior rei da história de Israel. Fortaleceu o reino, consolidou Jerusalém e expandiu as fronteiras da nação. Mas nos recônditos do palácio, falhou miseravelmente como pai, seja no exemplo, nas palavras ou nas atitudes. 

Polígamo inveterado, colecionou esposas como se fossem mudas de roupas (Mical, Abigail, Ainoã, Eglá, Maacá e Bete-Seba) sem se importar com as consequências de seus impulsos (hábito este seguido por seu filho Salomão).

Destes relacionamentos vieram mais de vinte filhos, o que limitou a intimidade do pai com cada um deles. Foram educados magistralmente como príncipes e princesas, mas renegados como filhos e filhas, crescendo sem a imposição de limites ou parâmetros de moralidade.

Enquanto isto, Davi errava ao preferir abertamente Absalão em detrimentos dos demais filhos ou escolhendo Salomão como herdeiro do trono por este ser filho de Bete-Seba, sua esposa mais influente.

Por ser ausente até mesmo quando estava presente, Davi sequer percebeu a crescente tensão sexual em sua  mesa de jantar, o que desencadeou o estupro de sua filha Tamar pelo próprio irmão Amnom.

Ciente do acontecido foi omisso ao não punir Amnom e nem acolher a princesa deflorada. Esta passividade gerou o ódio de Absalão que se encarregou de assassinar seu irmão Amnom.

Desta vez, Davi teve um surto de raiva contra seu filho favorito, e Absalão fugiu para três anos de exílio. Neste tempo, Davi nada fez para se reconciliar com seu filho. No retorno do pródigo, o “rei” (não o pai) recebe o "príncipe" (não o filho) com um beijo formal, fugindo mais uma vez da responsabilidade paterna.

Indignado com tamanha indiferença, Absalão promoveu uma guerra civil em Israel, e Davi se viu obrigado a fugir de Jerusalém, sendo perseguido pelo próprio filho. Neste conflito, Absalão morreu e Davi lamentou a morte do filho, amargurado por saber que já era tarde para reconciliações.

Antes de sua morte, Davi ainda teve que lidar com mais uma guerra nacional provocada por rupturas em sua família, quando seu filho Adonias usurpou o trono do pai, e Davi precisou coroar Salomão às pressas para cumprir a promessa que fizera a Bete-Seba.

Davi nos deixa valiosas lições com os seus erros, e a principal delas é que a família vem antes do reino. Uma nação que emerge de famílias fragmentadas, implodirá sobre as próprias bases. Davi era um homem elogiável, um rei austero, um músico brilhante, um adorador por excelência.

Andava lado a lado com Deus e isso lhe garantiu suas grandiosas vitórias, mas andava distante de seus filhos, o que causou suas mais vergonhosas derrotas.

Por outro lado, a conduta de Absalão é uma prova cabal que quando um filho desonra seu pai, encontra um fim precoce e vergonhoso. Davi falhou em ser pai e isso custou sua honra, já Absalão fracassou como filho e com isto perdeu a vida.

Nenhum comentário:

Postar um comentário