Tratando-se
de profetas, falem dois ou três, e os outros julguem cuidadosamente o que foi
dito. Como em todas as congregações dos santos. (I Coríntios 14:29)
Pra entendermos com maior propriedade está
recomendação de Paulo, vamos relembrar um fato acontecido com o próprio apóstolo
em Atos 21:8-14.
Paulo
está cansado. O peso do ministério castiga duramente seus ombros. Nunca seus
amigos foram tão necessários. Um deles, em especial, se torna parte vital da
vida do apóstolo... Lucas, o médico amado, biógrafo e amigo pessoal de Paulo.
E é
Lucas que registra passo a passo a desgastante “terceira” e última viagem
missionária, que atravessou boa parte da Europa e da Ásia... Corínto, Éfeso,
Macedônia, Grécia, Mitilene, Troglío, Mileto, Éfeso outra vez, Cós, Rode,
Pátara, Fenícia, Chipre, Síria, Tiro, Ptolemaida... A festa de Pentecostes
estava chegando, e Paulo quer estar em Jerusalém para as comemorações, mas
ainda dá tempo de passar em Cesaréia e visitar Felipe, um velho amigo. Aquela
casa era um “point” de profetas, pois as quatro filhas donzelas de Felipe
profetizavam... O apóstolo fica por ali vários dias. Numa certa manhã, um
profeta que vinha da Judéia, por nome Ágabo, se junta ao grupo de visitantes.
Ele se dirige a Paulo, tira sua cinta, amarra pés e mãos do apóstolo e
profetiza: - “Assim
ligarão os judeus em Jerusalém o homem de quem é esta cinta, e o entregarão nas
mãos dos gentios.”.
Ao ouvir
tal mensagem, Lucas intercede a Paulo que mude seus planos e não desça para
Jerusalém, mas Paulo está irredutível e responde: - “Que fazeis vós, chorando e
magoando-me o coração? Porque eu estou pronto não só a ser ligado, mas ainda a
morrer em Jerusalém pelo nome do Senhor Jesus”.
Sem
mais argumentos para impedir a viagem, Lucas se conforma, colocando tudo nas
mãos do Senhor
Esta mensagem de Ágabo nos dá uma perfeita
compreensão do mecanismo de uma profecia.
Ágabo era um homem de Deus e sua mensagem era
divinamente inspirada, tanto que Paulo, homem dotado de discernimento
espiritual não o repreende e aceita suas palavras.
Agora analisemos esta profecia ponto a ponto.
“Assim
ligarão (do grego “deo” – amarrar) os judeus em Jerusalém o homem de quem é
esta cinta...”
Correto: Paulo
foi preso em Jerusalém, pouco depois de sua chegada.
Incorreto: Não
foram os Judeus que amarraram Paulo, mas sim os tribunos romanos (Atos 31:33).
“...e o
entregarão (do grego “paradidome” – dar voluntariamente) nas mãos dos
gentios.”
Correto:
Após
sua prisão, Paulo ficou sobre a
custódia dos gentios (romanos).
Incorreto:
Os
judeus não “entregaram” Paulo aos
romanos, pelo contrário, tentaram matá-lo, e foi exatamente a intervenção
providencial dos tribunos e dos centuriões romanos que salvou a vida do
apóstolo de um linchamento popular (Atos
21:31-32).
Temos,
portanto neste caso, uma mensagem correta, com alguns pontos interpretados
incorretamente pelo profeta.
O que é uma profecia?
Não
entraremos aqui no mérito da palavra profética ou do louvor profético, também
não falaremos da profecia como ministério. Abordaremos apenas a profecia como
um DOM ESPIRITUAL e neste contexto a ela é a habilidade sobrenatural de se
transmitir uma mensagem de Deus através da inspiração direta do Espírito Santo
(I Pedro 1:21). Por ser uma manifestação espiritual da parte de Deus, o DOM de PROFECIA está disponível a todo
cristão que é cheio do Espírito Santo, e Paulo nos aconselha a buscar com zelo
este DOM (I Coríntios 14:1).
O que é um profeta?
No
contexto do DOM DE PROFECIA, profeta
é o indivíduo que recebeu do Espírito Santo a capacidade de entender uma
mensagem enviada por Deus e transmiti-la aos demais em uma língua compreensível
a todos. O profeta é um intérprete,
e não um boneco de ventríloquo que apenas empresta sua boca para outro falar.
No momento em que estiver profetizando, o profeta “não” estará em “transe” ou “êxtase”, pelo contrário, estará em plenas faculdades mentais, usando seu
próprio vocabulário, construindo cada frase, ditando o ritmo da mensagem e
tendo completo controle carnal sobre a ação espiritual (I Coríntios 14:32).
Qual a utilidade da Profecia?
Ao
contrário do que muita gente pensa, uma profecia não é prioritariamente um
presságio, que visa apenas predizer o futuro e trazer revelações escatológicas
(embora isso possa ocorrer), mas sim proclamar a congregação a vontade de Deus.
A mensagem de uma profecia pode revelar a condição do coração de uma pessoa,
prover edificação, exortação, advertência, proclamar juízo, bem como levar o
povo a retidão e a fidelidade (Coríntios 14:3).
Quando profetizar?
Apenas
quando receber uma mensagem. No contexto neo-testamentario, não há referências
de uma igreja buscando orientação com profetas, pois este tipo de ensino passou
a ser obtido dos líderes eclesiásticos. A mensagem profética só ocorria na
igreja por iniciativa divina, quando o Espírito acionava o profeta para tal, e
assim se procede até os dias de hoje. Pode sim ocorrer de vários profetas
receberem a inspiração em um curto período de tempo, mas Paulo ensinou a igreja
em Corinto que profetizassem um de cada vez, a fim de se obter uma melhor
compreensão de cada mensagem (I Coríntios 14:31-33).
Uma profecia pode estar errada?
Sim.
Não falaremos aqui sobre falsas profecias, pois tais devem ser imediatamente
censuradas por aqueles que possuam o DOM
de DISCERNIMENTO de ESPÍRITOS, mas sim sobre profecias divinamente
inspiradas que apresentam erros em sua interpretação, como por exemplo, a de
Ágabo em relação a prisão de Paulo.
Ao
se interpretar uma mensagem, seja codificada, ou em outro idioma, sempre haverá
divergências entres os intérpretes.
Para
melhor ilustrarmos isso, usaremos o seguinte exemplo:
Este
é o refrão (em sua língua original) da canção Power of Your Love, que
ficou muito popular no Brasil, devido às várias versões que recebeu em terras
tupiniquin:
Hold me close / Let Your love
surround me / Bring me near / Draw me to Your side / And as I wait / I'll rise up like
the eagle / And I will soar with You / Your
Spirit leads me on / In the power of Your love.
Numa de suas traduções mais
conhecidas em língua portuguesa, a canção ficou da seguinte forma:
Junto a ti / Teu amor me envolve / Atrai-me / Pra a teu lado estar / Espero
em ti / E subo como águia / Nas asas do espírito/ Contigo voarei / No poder do teu
amor.
Veja agora como a mesma
canção fica com uma tradução literal feita por um programa de computador.
Segure-me perto / Deixe seu
amor me cercar / Traga me perto / Desenha me ao seu lado / E como eu espero /
Eu vou levantar-me como águia / Eu vou subir com você / Teu Espírito me leva / No poder do seu amor.
Agora
veja a mesma letra em uma versão mais “polida”.
Cobre-me / Com teu amor me envolve / Toma- me / Perto
quero estar / E por esperar / Novas forças eu terei / E me levantarei / Como águia voarei / Pelo poder desse amor.
Perceba que uma mesma mensagem, embora
mantendo sua essência, pode ser
interpretada e traduzida de formas distintas. E exatamente o que acontece com
uma profecia. Ágabo traduziu corretamente a essência da mensagem: A prisão de Paulo em Jerusalém; mas
tropeçou nos detalhes trocando “romanos”
por “judeus” e “quase te matarão”
por “te entregarão”.
Um
outro erro comum é o uso incorreto de determinada palavra ou expressão dentro
de um contexto específico. Por exemplo, se um profeta receber uma mensagem de
Deus em que a palavra central seja “PENA”,
todo o contexto precisa ser bem interpretado, considerando que na língua
portuguesa “PENA” possui muitos significados, tais como:
“Senti pena do pobre coitado” (pena = compaixão)
“Pegou a pena para assinar a carta” (pena = caneta)
“Que bela pena de Faisão há em seu chapéu” (pena = relativo a pássaros)
“Acho que a pena aplicada foi muito rigorosa” (pena = punição)
Digamos
que o cerne da mensagem divina recebida seja
sobre a entrega de uma “pena” nas mãos de alguém. Veja que sem um
contexto bem definido o profeta poderia utilizar o conceito “pena” de várias e
distintas maneiras. Mas qual seria a correta?
“Deus colocará uma pessoa necessitada
em sua vida” (“Pena” como “Compaixão”)
“Em breve você assinará aqueles
documentos...” (“Pena” como “Caneta”)
“Sua vitória está chegando... Você
ainda voará como um pássaro...” (“Pena” com relação a “Pássaros”)
“Deus castigará seus inimigos” (“Pena”
como “Sentença”)
Por
isto a responsabilidade de quem profetiza é muito grande, e o profeta deve ser
cauteloso ao interpretar a mensagem de Deus, tomando cuidado para não colocar
palavras fora de contexto, ou “enfeitar o pavão” inserindo por conta própria
datas, lugares e situações para a realização das mesmas. Por estas razões o
profeta deve buscar com muito afinco DONS como a PALAVRA DA SABEDORIA e a PALAVRA
DO CONHECIMENTO, bem como o DISCERNIMENTO
DE ESPÍRITOS e INTERPRETAÇÃO DE
LÍNGUAS, pois todos estes dons agindo em conjunto, ajudaram numa
transmissão clara e perfeita da mensagem de Deus à congregação.
Como reagir a uma profecia?
Exatamente
por estes possíveis desvios interpretativos, a igreja não deve ter como
infalível todas as profecias. Por isso Paulo aconselha que enquanto alguém profetiza,
os demais devem julgar esta profecia (I Coríntios 14:29). Este julgamento deve
considerar os seguintes pontos:
-
É autêntica?
-Seu
conteúdo é coeso (não causa confusão)?
-Se
enquadra na Palavra de Deus?
-Contribui
para a santificação e edificação de quem ouve?
-
É transmitida por alguém cheio do Espírito Santo?
Lembre-se
sempre que todo homem (mesmo o mais usado pelo Espírito) está sujeito a cometer
erros, mas DEUS não erra.
Se
o Senhor te fez promessas através de uma profecia e o profeta te mandou marcar
no calendário “o dia da vitória” e a data passou em branco na sua vida,
esqueça da agenda estabelecida pelo profeta e foque-se apenas na promessa, pois
quem a fez é fiel para cumprir, mas ele apenas a cumprirá em seu tempo
perfeito, e não no tempo estabelecido pela “empolgação” do homem.
Pb. Miquéias Daniel Gomes
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