Sabemos que a Bíblia Sagrada é a santa e perfeita vontade de Deus, e que devido a sua inspiração espiritual, ela não falha, não mente e se mostra absolutamente clara em suas posições. Mesmo assim, um número grande de estudiosos se dedicam a procurar em suas páginas, qualquer traço de inverdade ou confusão, para dar fim a sua milenar veracidade, disseminando teorias injustificadas e criando dúvidas sobre determinadas passagens. Por exemplo, muitas pessoas ficam incomodadas
com a aparente discrepância nos relatos bíblicos sobre a morte de Judas
Iscariotes, o discípulo que traiu Jesus. Isto porque o texto de Mateus 27:5 diz claramente que ele “se enforcou”,
enquanto Lucas, relata em Atos 1:18, que Judas “se jogou de penhasco e seu
corpo partiu ao meio”.
Assim sendo, qual a versão
correta deste acontecimento trágico? Por que existe divergência nos relatos desses escritores?
Obviamente esta discussão tem se estendido ao longo dos anos e para esclarece-la, muitos estudiosos recorrem a história exegética dos textos, ao testemunhal dos exegetas da antiguidade e aos muitos dicionários que tentam explicar todas as variáveis do verbete “Judas”. Porém, tentaremos aqui elucidar de uma forma sucinta e direta, como os dois relatos, mesmo diferentes, se harmonizam entre si.
O primeiro ponto a ser esclarecido é que os evangelhos foram escritos em períodos diferentes, em línguas diferentes e para destinatários diferentes. A obra literária de Mateus, foi baseada em suas lembranças e memórias, já que testemunhou os acontecimentos em loco, participando em primeira pessoa da história. Como escreveu seu evangelho para os judeus, entre os anos 50 e 60 da era cristã, usou o aramaico, uma língua própria de seu povo. Já Lucas, não foi um participante direto do ministério de Cristo, e nem sequer conheceu Jesus. Ele era um médico grego respeitado de seu tempo, e se converteu ao cristianismo através da pregação apostólica, se tornando um dos mais fiés seguidores de Paulo. Didático e erudito, Lucas elaborou dois estudos sobre as origens desta nova “religião”, sendo que no primeiro ele se focou na história do próprio Jesus (Evangelho de Lucas), e no segundo, registrou os primeiros anos da igreja recém estabelecida (Atos dos Apóstolos). Escreveu seus textos por volta do ano 70 dc, utilizando o idioma grego (uma língua falada em praticamente todo o mundo conhecido da época), e entregou seu relato para os gentios.
O segundo ponto a ser entendido
é o local conhecido como “Aceldama” ou “Campo de Sangue”. Esta propriedade
ficava localizada em Jerusalém, ao lado de um lixão público conhecido por
Geena, para onde era levado todo o livro da cidade, bem como as imundícias provenientes
da limpeza realizada após os sacrifícios de animais. Agora, o fato mais
relevante sobre este campo, é exatamente sua geografia, pois se tratava de um
penhasco rochoso. Neste lugar também era encontrado um tipo de argila vermelha
muito utilizado por oleiros, e daí talvez tenha se originado de fato seu nome.
A história por traz da compra deste lugar é tão interessante quanto o fato ali
ocorrido. Mateus, testemunha ocular dos acontecimentos, conta que após a
traição contra Jesus, Judas foi tomado por um remorso imensurável, e
desesperado, correu até os príncipes dos sacerdotes e aos anciões judeus, e tentou
devolver o dinheiro que recebera, e com isso impedir a morte de seu
mestre. Em prantos ele jogou as moedas de prata na direção daqueles homens, enquanto
se lamentava dizendo: - “Pequei, traindo
o sangue inocente”. Porém, este gesto não comoveu aos líderes religiosos de
Israel, que em resposta apenas disseram: - “O
que isso nos importa?”. Vendo que não havia mais meios de remediar seu erro,
Judas saiu dali e se enforcou. Então os príncipes dos sacerdotes chegaram à
conclusão que era ilícito depositar aquele dinheiro no cofre de ofertas do
templo, pois estava sujo de sangue, e após deliberaram, compraram com aquela
quantia um lugar chamado “campo do oleiro”, e o transformaram em um cemitério
para estrangeiros, e por isso, o local recebeu o nome de “Campo de Sangue” (Mateus
1:1-8).
Lucas, por outro lado, não
vivenciou os acontecimentos, e portanto registrou o ocorrido, de acordo com as
informações colhidas em suas pesquisas. Assim, ele menciona em Atos 1:16-19,
parte de um dos primeiros sermões de Pedro após a morte de Jesus, provavelmente
recontado por um de seus entrevistados que esteve presente no dia: - Homens irmãos, convinha que se cumprisse a
Escritura que o Espírito Santo predisse pela boca de Davi, acerca de Judas, que
foi o guia daqueles que prenderam a Jesus; porque foi contado conosco e
alcançou sorte neste ministério. Ora, este adquiriu um campo com o galardão da
iniquidade; e precipitando-se, rebentou pelo meio, e todas as suas entranhas se
derramaram. E foi notório a todos os que habitam em Jerusalém; de maneira que
na sua própria língua esse campo se chama Aceldama, isto é, Campo de Sangue.
Juntando os dois relatos, é fácil
a compreensão do histórico de compra daquela propriedade. Judas de fato morreu
ali e local foi comprado pelos líderes religiosos judeus que o transformaram em
uma área de sepultamentos. Entretanto, o dinheiro usado nesta compra, de fato
pertencia a Judas Iscariotes, logo, subjetivamente (e na interpretação de
Pedro), ele era de fato, o dono do lugar.
Quanto a causa da morte, não
existe discrepância entre os textos, mas sim mudança na perspectiva narrativa
do escritor. Podemos então dizer que Mateus trata da tentativa de suicídio, e
Lucas descreve as consequências deste ato.
Judas de fato, correu até o “Campo
do Oleiro” e se enforcou. Considere que nos arredores de Jerusalém, por
questões geográficas e histórias, não existiam árvores de grande porte para
viabilizar um suicídio, e portanto, ele provavelmente precisou escolher uma árvore
pequena, mas que estivesse à beira de um penhasco. Amarrou uma corda (ou algo
semelhante) nesta árvore, atou-a também em seu pescoço e se lançou para baixo.
Aparentemente, a corda se rompeu ou o galho quebrou, de modo que o corpo de
Judas despencou de uma altura considerável, e se arrebentou nas rochas abaixo. Outra
possibilidade é que a expressão “se
precipitando de cabeça para baixo”, seja um termo médico usado por Lucas
para “inchação”, ou ainda, que o
cadáver tenha inchado, arqueado a cabeça e em decorrência do calor, caído por
terra.
Em resumo, embora muitos citem esses
relatos como “contraditórios” e com isso questionam a veracidade da Bíblia
Sagrada, o estudante apaixonado pela Palavra de Deus rapidamente entende que
ambos os textos, na realidade se completam, e nos dão um cenário conciso da
morte deste icônico personagem, que serve de exemplo para todos nós, de quão trágico
é o fim daqueles que se deixam dominar pelos próprios desejos, e com isso traem
o evangelho de Jesus Cristo.
Fiquei um pouco confusa...
ResponderExcluirA explicação da a entender que A propriedade foi comprada após a morte de Judas. Se foi desta maneira, como poderia ser dono estando morto?
Eu gostaria de entender
Isso em Matheus.
ResponderExcluirPorém em atos, dá-se a entender que primeiro ocorreu a compra e depois a morte